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terça-feira, 3 de novembro de 2009

O RETRATO DE SIBYL VANE

ENTRELINHAS

O trajeto de Sibyl Vane, na pintura viciosa do "O Retrato de Dorian Gray" começa pelos espaços da arte marginalizada, o teatro pobre (de talento e estrutura de produção), cujos sons dissonantes constituem na ousadia de encenar a mais cultuada propriedade inglesa de todos os tempos, a obra de William Shakespeare, o qual  introduz a força orgânica na sua personagem exercendo posse sobre a jovem atriz. Sibyl é uma criatura simples e ingênua sem qualquer ascendência destacável. A separação entre a arte suprema e sua concretização vulgarizada é claramente evidenciada. Mas também na obra é possível encontrar o descompasso fatal que pontua sempre a fissura entre o real e o ideal na figura, o qual a atriz empresta sua matéria carnal para construção da arte. Mas, a partir do momento em que a vida se intromete com sentimentos reais, e não interpretação dramática, vemos emergir o holocausto de Sibyl Vane.É claro que o esteticismo radical proposto por Oscar Wilde difere da teatralidade interventora das vanguardas. Estas levam “ás últimas conseqüências a sua antiga ascendência romântica”, recusam a “separação entre a práxis social e a arte”.  e abandonam, assim, “a atitude passiva, puramente contemplativa perante a vida” , que caracteriza os seguidores de vanguarda cuja a obsessão pela postura de Sibyl Vane mal se disfarça. É o caso de Mário de Sá-Carneiro que, cansado de inventar-se como personagem literário, antes de completar 26 anos de idade optou por se afastar definitivamente da vida real. É também o caso de Fernando Pessoa, que quase conseguiu abolir a vida para viver apenas de literatura. O poder desta decisão se mostra com mais força quando Dorian recusa a única oportunidade de escapar do seu destino: o amor de Sibyl Vane, que ele rejeita por perceber, talvez, a sua incapacidade de amar sem quebrar o pacto com o quadro, e na escolha feita de viver para os seus sentidos. Dorian é platéia e ator simultaneamente. Seu único objetivo “(..) não é o fruto da experiência, mas a própria experiência” Manter esta condição para a personagem, talvez seja o êxtase é o êxito da vida (idem).Além disso, sua aparência física é tão perfeita que ele pode ser considerado como uma obra de arte, com um signo, que é um e dois, significante e significado pois, segundo o prefácio "toda arte é ao mesmo tempo superfície e símbolo". Como tal, consciente disto, Dorian viveu a sua singularidade-signo, e aqueles que "...buscam sob a superfície fazem-no por seu próprio risco..." como Sibyl Vane que procurou o coração de Dorian e, a ela restou o menosprezo passando novamente para a esfera da arte.

Colaborador do INSERT: Sidnei de Oliveira
Foto de divulgação: Ana Paula Mello


Um comentário:

Unknown disse...

Seu texto me serviu como inspiração, a análise sobre a figura de Sibyl é emocionante e segura. parabéns